A nação mais poderosa do mundo foi atacada, e teve um dos seus símbolos destruído, não por uma ação militar comandada por um Estado, mas por um ato terrorista
Para efeitos de pesquisa ou de didática, historiadores e cientistas sociais costumam adotar datas de acontecimentos relevantes como referências para as mudanças de época, entendendo-se aqui época como um grande período de tempo no qual vigora um determinado paradigma, que estrutura os sistemas políticos e sociais, bem como as relações internacionais.
No dia 11 de setembro de 2001, a nação mais poderosa do mundo foi atacada, e teve um dos seus símbolos destruído
A título exemplo, podemos nos referir a Revolução Americana de 1776 e a queda da Bastilha de 1789 como o início da Modernidade; e a desagregação da União Soviética, como um processo que determina o fim da Guerra Fria, que se inicia logo após a Segunda Guerra Mundial, e que, durante décadas dividiu a ordem política mundial em dois grandes blocos: o socialista e o capitalista.
Com a queda do Muro de Berlim em 1989, muitos cientista sociais decretaram o triunfo da civilização ocidental, com a preponderância dos ideais de cunho liberal. Segundo essa visão, a democracia liberal haveria de prosperar entre os mais diversos países, o que significaria o “fim da História”, com o “congelamento” da ordem política mundial em um sistema de Estados-Nações, governados por regimes democráticos.
Esse entusiasmo durou até os atentados de 11 de setembro de 2001, quando a nação mais poderosa do mundo, em termos econômicos, militares e culturais, foi atacada, e teve um dos seus símbolos destruído, não por uma ação militar comandada por um Estado, mas por uma facção terrorista, que foi capaz de burlar todo o sistema de segurança norte-americano, e promover um morticínio sem precedentes, ao menos nessa modalidade de ação: o terrorismo.
Os significados do 11 de setembro
Passados seis anos dos atentados de 11 de setembro, a configuração de uma nova ordem política mundial ainda não está completamente desenhada. No entanto, já é possível afirmar que a existência de grupos terroristas, com tal capacidade de destruição e de morticínio, atacando alvos civis em momentos de alta concentração de pessoas, vai exigir dos serviços de inteligência, novas medidas de segurança. Isso significa uma profunda mudança de paradigma, que impõe aos Estados nacionais novas concepções de segurança interna.
A imagem do Estado nacional começa a se configurar no continente europeu com o Tratado Westphália em 1648. Esse tratado demarca a divisão geográfica da Europa e reconhece a soberania do Estado-Nação como referência para as relações internacionais em termos políticos, econômicos e militares.
Em outras palavras, a partir de Westphalia, as negociações políticas e econômicas, bem como os conflitos militares, não seriam mais tratados no âmbito dos pequenos reinados e territórios, mas sim no âmbito de uma instituição política e jurídica denominada Estado.
Com a intensificação da globalização, no início dos anos de 1990, o papel econômico e político do Estado-Nação passou a conviver paralelamente, com instituições supranacionais, ou seja, instituições que não estavam subordinadas a um único Estado, mas que eram resultado de um acordo entre vários Estados. Tais acordos visavam a criação de regras mínimas em termos de comércio entre paises, uma vez que, a globalização possibilitou o crescimento das empresas multinacionais. Essas empresas distribuem seus estabelecimentos industriais e comerciais, em vários pontos do planeta, sempre buscando as condições que são mais favoráveis para seus negócios, o que eleva de modo significativo o grau de interdependência entre as economias nacionais. A criação de instituições como a Organização Mundial do Comércio e o Fundo Monetário Internacional pode ser vista como resultado concreto da internacionalização da economia, cujas tendências já se manifestavam no Pós-Segunda Guerra.
Os atentados de 11 de setembro de 2001, possibilitaram a legitimação do governo Bush, até então uma liderança sem marca própria
No âmbito político a ONU (Organização das Nações Unidas), criada logo após a Segunda Guerra Mundial, visava, sobretudo, estabelecer negociações diplomáticas entre os Estados nacionais, a fim de evitar outro conflito bélico em escala catastrófica.
Todas essas instituições supranacionais não fizeram desaparecer a figura do Estado-Nação, mas reduziu parte de sua soberania uma vez que, seus governos tiveram que condicionar muitas de suas decisões internas aos acordos internacionais.
Contudo, até os atentados de 11 de setembro de 2001, a segurança interna dos Estados nacionais levava em conta, como maior ameaça, o potencial ataque de outro Estado-Nação e não de grupos terroristas.
O Governo Bush e a escalada do terrorismo
Os atentados de 11 de setembro de 2001, possibilitaram a legitimação de um governo até então sem uma marca própria. Basta para tanto, lembrar que a eleição de George W. Bush ocorreu em meio ao questionamento dos resultados do arcaico colégio eleitoral, instituição política que congrega os delegados eleitos pelos cidadãos para elegerem o presidente da República.
A partir dos atos terroristas, o governo Bush passa a implementar uma política externa de caráter estritamente conservador, e marcada, sobretudo, pelo unilateralismo, ou seja, uma política externa que age apenas segundo os interesses estratégicos dos Estados Unidos, sem se submeter à fóruns e acordos internacionais. Mesmo sendo fato consumado a consolidação dos Estados Unidos como a única superpotência existente após a desagregação da União Soviética, governos anteriores buscaram, no mínimo preservar a Organização das Nações Unidas como instituição mediadora dos conflitos políticos internacionais, ainda que, conduzida segundo os interesses dos Estados Unidos por meio da ideologia designada como soft power.
Em resposta aos atentados, Bush dissemina uma verdadeira “ideologia de cruzada”, dando às suas ações militares, uma fundamentação quase religiosa. A tosca política externa do governo Bush dividiu o mundo entre o “eixo do bem” e o “eixo do mal”, enquadrando no primeiro os aliados dos Estados Unidos e, no segundo, os países islâmicos e a Coréia do Norte.
Sob o pretexto de responder aos atentados e às potenciais ameaças, Bush bombardeia o Afeganistão, país acusado de abrigar o grupo terrorista Al- Qaeda, e invade o Iraque em 2003, alegando a existência de possíveis armas de destruição em massa em poder de Sadan Hussein. Tais ações militares trouxeram na verdade poucos resultados concretos.
A invasão do Iraque se revela hoje, uma questão que coloca republicanos e democratas num beco sem saída. O governo norte-americano se vê obrigado a manter tropas militares no território iraquiano na tentativa de evitar que o país mergulhe numa guerra civil aberta.
Perspectivas
A “missão” de democratizar o Iraque dificilmente será concluída com êxito
É pouco provável que a “missão” de democratizar o Iraque seja concluída com êxito, o que nos coloca uma série de interrogações a respeito das perspectivas da ordem política mundial desencadeada pelo 11 de setembro.
Na verdade, o que os atentados terroristas revelam, é que os Estados nacionais necessitam desenvolver sistemas de segurança capazes de lidar com um inimigo que, muitas vezes, não se localiza, geograficamente, no espaço de um Estado-Nação, mas que se dissemina por várias regiões, tornando extremamente complexas as possibilidades de reação dos países vítimas do terrorismo.
Ora, se o inimigo não se localiza em Estado, de nada adianta ocupações militares em larga escala. Assim como as instituições supranacionais foram criadas para conduzir as relações internacionais no campo econômico e político, é necessário que os Estados-Nações desenvolvam mecanismos de cooperação na área de inteligência a fim de estreitar o cerco sobre os grupos terroristas.
Esta é a principal lição deixada pelo 11 de setembro, e que necessita ser assimilada pelos futuros governantes, em especial, os norte-americanos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário